Leia a entrevista de Fernando Valenzuela Migoya, presidente da Cengage Learning Latinoamérica e da divisão National Geographic Learning pela América Latina, à revista Profissão Mestre.
Educar para um mundo sustentável
Escrito por Analice Bonatto
Publicado em 02 Junho 2014
Profissão Mestre: Como educar para um mundo sustentável?
Fernando Valenzuela Migoya: Primeiro, é preciso reconhecer que a nossa geração falhou na criação de uma consciência de cuidado com o planeta; essa consciência, na maior parte das vezes, é apenas citada como preservação do meio ambiente. Mas a National Geographic Learning olha para todo o planeta. Para nós, educar para um mundo sustentável é cuidar do planeta e de tudo que está nele. E a educação – que é a única ferramenta para mudar o comportamento humano – é uma força para equalizar as desigualdades que existem em muitas dimensões, como a desigualdade social e a de acesso à educação. Além da educação, a internet também é uma força para difundir, socializar e levar adiante as mudanças.
Profissão Mestre: Qual é o papel da escola em relação a essa questão?
Migoya: O conhecimento está na escola e fora dela. A escola conecta a educação formal com a informal. Se o aluno visita um museu, ele está aprendendo, mas como isso torna a experiência na escola melhor? Como o que o aluno escuta na família e nas notícias criam experiência de aprendizagem na escola? O problema é que ainda pensamos que a escola é o prédio, mas ela precisa estar mais conectada com o mundo.
Profissão Mestre: Com a tecnologia, o que muda na sala de aula?
Migoya: Muda o tipo de pessoa que precisa ser educada e as formas de acesso à informação que ela tem hoje. Muitas instituições, por exemplo, proíbem a entrada do celular em aula. Isso é proibir as novas gerações de atuarem no mundo delas, é tentar levar os estudantes de volta ao século XIX.
Profissão Mestre: Quais são os desafios de quem incorpora as tecnologias no processo de ensino e aprendizagem?
Migoya: São muitos. Na National Geographic, chamamos esse momento de a era da exploração. Isso significa que é necessário criar uma sensibilidade para o que está acontecendo no mundo e, ao mesmo tempo, levar a escola ao mundo. O conhecimento agora precisa ser descoberto. Essa capacidade é a única que vai criar aprendizado ao longo da vida.
Profissão Mestre: A National Geographic Learning [divisão da Cengage Learning] defende que o processo de aprendizagem pode ser emocionante, inspirador e transformador. Na prática, de que maneira isso pode acontecer na escola?
Migoya: A escola precisa ser o ponto de experimentação, criação e direcionamento do aprendizado. Nós não falamos de tarefa ou lição de casa. O aluno precisa ter uma missão.[A partir disso, observar] como é que o aluno se conecta com os colegas ou de que forma o aprendizado é enriquecido pela diversidade de missões. É importante que na escola o conhecimento seja criado, vivenciado, socializado e dirigido com experimentos que conectem os alunos com o mundo real. Essa é a dimensão que propomos. Hoje a atenção das crianças fica dividida entre uma grande quantidade de informações e de distrações. A escola não tem como proibir isso. Para captar a atenção do aluno, é preciso mudar a experiência dele na escola e, para isso, é preciso criar engajamento. E aí o resultado da escola vai mudando aos poucos. Não é colocar um teste muito complexo, mas sim criar experiência de aprendizado.
Profissão Mestre: Como é a avaliação nessa área?
Migoya: O que é avaliado hoje não é a capacidade necessária para o século XXI. Eu penso que a chave é o engajamento dos alunos por meio de projetos que estejam conectados com o mundo. O que tem que ser medido é como o projeto foi realizado e todas as capacidades que estão por trás dele. Se os alunos ficaram engajados, é sinal de que aprenderam. O conhecimento hoje não fica somente nas mãos do professor, da biblioteca, mas também com o estudante. Quanto conteúdo o estudante foi capaz de criar? E como o criou? Por meio da discussão, do entendimento e da conexão com os diferentes pontos? Se é testado um conteúdo que foi criado com a participação engajada do estudante, aí há uma das características que mostra uma mudança, com aprendizagem real.
Profissão Mestre: Como preparar o professor para educar para a sustentabilidade?
Migoya: Muitas instituições estão falando sobre a irrelevância e o desaparecimento do professor, mas o seu papel é fundamental, pois ele tem que ser quem dirige ou guia a criação de conhecimento. O primeiro passo é o professor reconhecer que não é mais a fonte de conhecimento; ele é o guia da criação do conhecimento. De qualquer forma, hoje o conhecimento e a informação ficam disponíveis para o estudante. O professor tem que mudar seu papel e guiar o estudante para que este faça uma aplicação que tenha uma consciência de cuidado pelo planeta e uma aplicação técnica dos conhecimentos e das habilidades que o aluno precisa. Isso não é uma fórmula, mas sim um caminho. É preciso ter essa consciência todos os dias. Quando o professor sabe guiar o conteúdo, a criação dos estudantes e a sua aplicação, o resultado da aprendizagem é bem melhor e o professor fica mais satisfeito com o seu trabalho. Assim, o primeiro passo é o professor olhar o seu papel de forma distinta.
Profissão Mestre: Quais as orientações para que a escola prepare projetos eficazes nessa área?
Migoya: Em nossa concepção, é o projeto que está conectado com a sociedade. Dependendo de onde a escola está localizada, ela terá determinada problemática social importante, como a desigualdade de acesso à educação, a pobreza ou a violência. Se a escola traz os problemas de sua comunidade para a sala de aula, cria um projeto engajado, conectado com as capacidades do século XXI e aplicado à sociedade, aí vira uma mudança bem simples. É trazer o mundo para a escola e nela encontrar respostas por meio da integração de diferentes disciplinas.
Profissão Mestre: Quais estratégias podem ser adotadas quando falamos em conscientização de crianças e jovens?
Migoya: A criança de hoje está bem perto da tecnologia e também está mais consciente do que nós. Ela tem mais percepção da importância do planeta. Eles não vão criar um mundo com a mesma desigualdade que a nossa geração criou. Para mim, o problema não é criar consciência, mas ficar engajado para fazer algo com essa consciência que já existe. Apesar de essa geração estar bem mais preparada do que a nossa, é mais difícil captar a sua atenção. Toda essa dispersão dá a percepção de falta de conscientização. Para mim, não é isso: é falta de engajamento. Quando se resolve essa questão, a conscientização cria resultados.
Profissão Mestre: Como promover processos educativos que possibilitem mudanças no olhar da relação do homem com o meio ambiente?
Migoya: O processo tem que ter dor. É preciso ter pessoas que sintam que o desequilíbrio existe e isso não é legal. Como eu disse, não é só o meio ambiente, são muitos desequilíbrios. É preciso que as pessoas sintam e tenham consciência de que isso precisa ser mudado. Você acha que a criança que está na rua praticando violência é diferente de nós? Você se sente bem de estar na escola enquanto há crianças desprotegidas na rua? Vamos fazer alguma coisa? Daí esse problema é trazido para se criar uma proposta para mudar o mundo.
Profissão Mestre: É possível criar uma cultura de preservação e uso racional dos recursos naturais?
Migoya: A cultura não é mais que a soma de comportamentos das pessoas. As únicas coisas que existem para mudar o comportamento de uma pessoa são educação e engajamento. Eu penso que a cultura tem sido olhada só como informação. O problema precisa estar perto de você para você atuar. E temos tantos problemas que precisamos criar essa relevância para os alunos saírem e fazerem alguma coisa.
Profissão Mestre: Essa é a geração conectada, mas como passar do clique para a ação?
Migoya: Por meio do engajamento. O aluno sente que pode fazer a diferença. Quando o aluno estuda o meio ambiente, o que está acontecendo com o solo, as espécies de animais e a água, por exemplo, tudo isso parece bem longe dele. Ele conhece tecnicamente, mas o engajamento é impossível, o que ele pode fazer? Mas se ele pode fazer algo com o que está próximo, daí há engajamento. As informações sobre o meio ambiente ficam, por exemplo, na Organização das Nações Unidas (ONU), e o aluno, na escola, olha para a ONU lá longe sem ter o que fazer. Não dá para se engajar com algo assim, mas é possível com o que está mais perto. Isso é mudança.
Profissão Mestre: Por onde começar?
Migoya: É preciso começar pela sociedade, pelos problemas que estão perto da escola e pelas coisas que são relevantes para o aluno. E não é possível que as escolas tenham as mesmas crianças, com a mesma consciência, pois elas têm realidades diferentes em casa.
Profissão Mestre: Como é a atuação da Cengage Learning/National Geographic Learning?
Migoya: A nossa atuação tem muitas dimensões. A primeira dimensão é criar conteúdos com muito mais engajamento; é escutar e entender o professor e o estudante. Nós estamos na etapa inicial e criando essa consciência. Assim, escutando o professor e o estudante e integrando a tecnologia para fazer educação, definimos que nossa empresa teria que ser de educação. Só que nós não temos muros, professores e estudantes. Nós ajudamos as escolas a fazerem a própria experiência da aprendizagem e a mudarem o jeito de os alunos aprenderem nela.
Profissão Mestre: Qual é o diferencial?
Migoya: Há o diferencial da missão da National Geographic. Nós acreditarmos na tecnologia mais como ferramenta, porque muitas empresas acreditam que a mudança simplesmente é trazer a tecnologia para a escola. Nós queremos a pedagogia com a tecnologia e a inclusão do professor, do aluno e da instituição para criarem. Estamos aproximando isso com um problema multidisciplinar e com visões complementares, o que na escola significa criar algo distinto.
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