quinta-feira, março 12, 2009

desumanização

A história de Gregor Samsa, A Metamorfose, de Franz Kafka, é sobre um homem insetizado, ou seja, um homem transformado em inseto. Trata-se de uma alegoria da desumanização do homem moderno.
Esta novela, que marcou a história da literatura moderna, é um grande monólogo e dentro dele a personagem ouve as vozes dos outros personagens. Assim, na textualização da personagem acontece sua interiorização, ela não age, mas, sim, pensa.
Tudo acontece na mente de Gregor, como uma espécie de diálogo interior e quando ele acorda inseto, vê-se obrigado a colocar-se diante de sua própria alienação. “Fechou os olhos para não ver aquele reboliço das pernas (...) ‘Meu Deus!’”, pensou então. “Quão trabalhosa é a profissão que escolhi! Um dia sim e outro também, em viagem”. (KAFKA,1998, p.8).
A representação da personagem como uma autoconsciência é uma das questões que aproximam A Metamorfose da construção polifônica do romance. Podemos dividir a história em três partes. A primeira seria a autoconsciência da alienação e da desumanização da personagem. Nela, Gregor não entende a situação fantástica e acredita que voltará ao normal. Ele não compreende que o real é o inseto. Portanto, seria a autoconsciência da alienação - passagem da inconsciência para a consciência de Gregor. E com o tempo, ele toma consciência do ser submisso, dependente, preso as obrigações do trabalho e da família.
A fala de Samsa traz em seu interior o que os outros dizem ou pensam a seu respeito. “Já sei que na firma ninguém quer bem ao viajante. Todos acreditam que ganha dinheiro com espertezas, e leva uma vida de luxo” (KAFKA, 1998, p. 22).
E é neste longo monólogo interior contado por um narrador que repercute a fala das outras personagens. Percebemos as outras falas se reproduzirem no discurso vitimista relatado por Samsa e no discurso crítico de Kafka.
A segunda parte, versa sobre a tomada de consciência por parte da família, mas é uma falsa conscientização, pois acreditam que o estado de Gregor é passageiro, eles veem o inseto como ficção e o consideram uma doença. ‘Mas, certo, arrependeu-se de seu procedimento, pois tornou a abrir no mesmo instante e entrou nas pontas dos pés, como se fosse o quarto de um enfermo grave ou o de um estranho’(KAFKA, 1998, p. 30).
A família inconsciente, após tentar explicar o novo estágio do filho como doença, tem de tomar uma solução. E é na terceira parte da história, quando Gregor não muda, que fica claro que ele já não pode se negar a aceitar a verdade, mas a família inconsciente sim. Gregor se mata. A família volta à vida alienada redescobrindo a irmã que se prepara para o casamento salvador que os integrará a sociedade inconsciente. ‘(...) tinha-se desenvolvido e convertido em uma linda jovem cheia de vida. Sem trocar palavra, (...) disseram-se um ao outro que já era tempo de encontrar um bom marido para ela. (KAFKA, 1998, p. 74)
E nesse monólogo do próprio Samsa que integra a voz do autor crítico e irônico: ‘Mas o pai, com a obstinação que se tinha apossado dele desde que era empregado, persistia em querer permanecer mais tempo à mesa. (KAFKA, 1998, p. 52), a do discurso do narrado vitimista de Gregor, ‘E depois perdia também o humor de preocupar-se pela sua família e apenas sentia em relação a ela a irritação produzida pela pouca atenção que se lhe dispensava’ (KAFKA, 1998, p. 55) às vozes de todos as personagens.

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